Da nossa essência de vidro
Maria do Carmo Nino
Agosto a Outubro de 2017
Nossa essência de sombras
“Corpo tocado, tocante, frágil, vulnerável, sempre mudando, fugindo, inapreensível, evanescente sob a carícia ou sob o golpe, corpo sem casca, pobre pele tensionada sobre uma caverna onde flutua nossa sombra...” Jean-Luc Nancy, 58 indícios sobre o corpo. Em Corinto, a filha do oleiro, apaixonada por um jovem que partiria em viagem, desenha na parede a sombra de sua face projetada por uma lamparina.
Seu pai, aplicando-lhe argila, confeccionaria um molde que levaria ao fogo junto com os outros vasos de barro. No mito de Dibutades [ou Butades], narrado por Plínio o Velho em sua História Natural, a arte tem, no contorno da sombra e na impressão por contato, sua invenção. A arte nasceria então como conjuração de uma ausência, a do ser amado, ao fixar o traço de sua presença ausente, de sua ausência presente? Trama de desejo e medo, sensualidade e artifício, é indissociável da morte e do desaparecimento. A jovem apaixonada é atravessada pela sombra cujo reino, desde os gregos, é o mundo dos mortos.