O prazer do olhar
Conchita Brennand
Janeiro a Fevereiro de 2018
O prazer do olhar
Toda arte nos leva ao prazer. Mesmo que, por exemplo, o horror contido em “Guernica” de Picasso, o desespero de “O Grito” de Munch ou a loucura da “Nau dos Insensatos” de Bosch, possíveis de nos trazer incômodos impactos, depois de vistos atenciosamente nos conduz ao prazer. O olhar faz primeiramente nos localizar diante do que se vê e identificar o que é visto.
Por outro lado, o que sentiram Picasso, Munch e Bosch quando realizaram as citadas obras? Prazer ou estranheza? Creio que as duas coisas. Pergunto ainda: e as paisagens de Monet, Van Gogh, Turner ou Pancetti? Puro prazer e pura dor: prazer de alcançar a beleza, e estranheza de arrancar de si aquela nova “coisa” que conviverá com os homens. Para o artista verdadeiro criação é como um parto: um misto de dor e prazer.
Essas ideias me ocorrem diante da arte de Conchita Brennand que apresento para o público da Arte Plural Galeria. Trata-se de uma artista que cria suas maravilhas encantadas pelos mistérios das matas da Várzea há mais de cinco décadas. Irmã de Francisco Brennand, um dos mais importantes artistas do Brasil, e talvez por isso mesmo, ela não é devidamente conhecida como a artista dona de talento e imaginação criativa como poucos. Embora sendo esta grande senhora pessoa muito conhecida em minha geração, vim conhecê-la recentemente e me surpreender ao ver pela primeira vez sua arte.
É claro que Conchita participa desde sempre do mesmo mundo que Francisco, da mesma história repleta de símbolos e miragens que seu irmão mais velho, do ambiente tropical das matas da Várzea e do Capibaribe donde existem lagos, açudes e aguadas, dos animais, pássaros especialmente, entre solos argilosos, troncos e galhos, folhas e frutos. O espírito da mata se revela em tudo, nas figuras sensuais, nos animais fantásticos e na flora, das raízes às folhas, que se constitui em tramas, malhas e tecidos que envolvem seus tantos corações abertos para o mundo.
Eis aí o ambiente que sugere o paraíso morno e eivado das cores extremas com que Conchita articula sua poética desenhada no seu mundo exótico, e concebe suas composições às vezes orgânicas, às vezes racionais, mas sempre incomuns.
Os sonhos, seu verdadeiro território, seu domínio, se revelam nas concepções que, caóticas embora, são como mapas sem pontos cardeais, texturas aveludadas rompidas por fortes traços como marcas de machados na árvore. Por se apegarem aos sonhos não quer dizer que sejam narrações, histórias, ilustrações gráficas da realidade. São, como qualquer obra de arte, símbolos em si, índices de seu imaginário, ícones elementais, signos de prazer. O prazer do olhar.
Curadoria de Raúl Córdula