RAFA ZIG

Escrever um texto sobre o próprio trabalho é uma tarefa bastante difícil, ao menos para mim. Também há muitas formas de como se escrever sobre estética, pintura e desenho, e muito já foi dito também.

Portanto, a melhor forma que encontrei para escrever sobre as obras aqui expostas hoje, foi com um depoimento bastante pessoal, pois trata-se de um trabalho que está arraigado em minha vida.

Os meios e a linguagem que o artista usa dependem muito das condições que ele dispõe e consegue preservar, e nesse caso, a pintura foi o único objeto remanescente das inúmeras experimentações das quais o artista se atreveu, todas as outras não resistiram às intempéries e mudanças da própria vida, nem tampouco às evoluções tecnológicas. O que restou é o que se expõe aqui, pinturas e cadernos de desenhos criados após a chegada do autor a Recife, em 2010. 

Nota-se principalmente nos cadernos que nunca houve uma preocupação com a preservação da produção. Uma exposição sempre foi um sonho um tanto remoto e utópico, e os cadernos foram arrastados junto com o autor para todos os cantos, frequentaram bares, praias, filas de repartição, viagens de ônibus e avião, reuniões de trabalho (quando muitas vezes serviram também como agenda) e com isso sofreram as consequências desses ambientes, porque para o autor, ter um caderno de desenho e qualquer tipo de instrumento que risque e pinte em mãos sempre significou um cano de escape, uma forma de conforto e um refúgio para momentos difíceis. 

Nos cadernos também pode-se observar uma variedade de técnicas e estilos de desenho, que são resultados do estado de espírito e do momento em que foram criados. Alguns são 

produtos da pressa, stress, raiva que também permeia nosso dia a dia, outros são frutos de momentos de tranquilidade e tempo livre. 

Essa série aqui exposta é muito especial para mim porque, tanto as pinturas, como os cadernos de desenho foram aos poucos sendo invadidos pela curiosidade de uma criança, que devia se questionar porque aqueles objetos e materiais conseguiam prender a atenção de seu pai por tanto tempo. Minha filha Laís nasceu em 2013, e por volta dos três anos, não tendo mais interesse pelos papéis, lápis e canetinhas que sempre ficavam à sua disposição, começou a querer ajudar o pai naquelas grandes superfícies que ficavam presas nas paredes.

Dividir o trabalho de pintura das telas com uma criança ao longo dos anos foi uma boa aventura e aprendizado para ambos. Para mim era desafiador e divertido quando, por exemplo, tentando pensar em como equilibrar a pintura com determinada paleta de cores, surgia Laís de repente com algum pincel que ela havia encontrado e pintava uma grande área com uma cor completamente fora do tom e da escala. Muitas vezes isso fez com que a pintura tomasse outro caminho e seu produto final se tornasse completamente diferente do que eu imaginava no início. Já para Laís, coube a ela aprender que algumas vezes aquele desenho que ela havia feito em alguma parte da tela desapareceu por baixo de uma grande pincelada distraída de seu pai, e por mais que nas primeiras vezes houve choro por causa de uma florzinha desenhada que se perdeu, aos poucos foi aceitando que as coisas não duram para sempre, mas também aprendeu a técnica de cobrir seus desenhos com fita adesiva para protegê-los da empolgação do pai na hora de pintar.

Comparados com trabalhos de épocas anteriores é visível a leveza, colorido e alegria que a experiência de partilhar uma tela com uma criança trouxe para as pinturas, e fico muito feliz por ter registrado esse momento de minha vida e poder expô-lo aqui na galeria Arte Plural.